segunda-feira, janeiro 29, 2007

O contraditório Delfim Netto

No que pensa o Delfim?

A entrevista das páginas amarelas da revista Veja desta semana (31/01/2007) ouve o ex-deputado federal e ex-ministro do tempo militar, Delfim Netto. Ele está lulando, há muito. Já até foi indicado como fiel do regime petista, quando o príncipe dos metalúrgicos passou a o ouvir em questões de política econômica (a política é econômica, oras). Uma espécie de aval da suposta direita para a embuçada esquerda.

Há muito mais pontos de contato e identidade entre o direitismo dos militares brasileiros que governaram o país e o esquerdismo dos militantes comunistas que os antagonizaram. Os pontos de contato, xifópagos inseparáveis, devem ser procurados nos ideais nacionais-socialistas que os embalam. A título de resenha histórica, gosto de dizer que os militares afastaram o avanço do socialismo no país e realizaram o maior governo estatizante de sua história. Fizeram o que os militantes comunistas fariam, em resumo. Triste e tétrica, para a prosperidade, ironia.

Bueno, mas e o Delfim?

Ele escreveu um artigo na imprensa diária, enaltecendo o legado teórico de Karl Marx. Daí, que Veja resolveu ouvi-lo. É o que suspeito.

"O velho Marx constatou, antes mesmo do surgimento do mercado, que a liberdade e a igualdade são incompatíveis. Que o homem livre naturalmente produz a desigualdade." - é uma frase da entrevista. "Se a desigualdade é natural em um mundo livre, é justo que as pessoas comecem a competir tendo tido as mesmas oportunidades de educação e de saúde." - é outra frase logo a seguir.

Desde já, não é preciso dizer, para o liberal autêntico, que as mesmas condições de educação e de saúde, como prega o Delfim dos militares, não são exeqüíveis na vida real. Minhas costas que doem, desde os 15 anos, devido a um problema de sifose, retiraram-me condições de igualdade daqueles que têm e tinham as palhetas sadias e não tiveram, enquanto competiam comigo, que conviver com a dor crônica. Ainda assim, fui, sempre, um dos melhores, por vez o melhor, aluno da sala de aula. Perdão pelo impressionismo, mas não desfrutei de igualdade de saúde. Quanto à educação, estudei para o vestibular enquanto trabalhava. Fui o 34° na classificação geral. Outras pessoas concorreram comigo, apenas estudando. Ficaram no limbo da pontuação.

So much for equity, huh?

Mas o Delfim, para, de novo, voltar a ele, sem o ter abandonado, diz, na mesma entrevista de a Veja que está nas bancas, quatro respostas depois, que o Estado brasileiro apresenta distorções, que contemplam a desigualdade pela lei, quando afirma "Veja o caso da vinculação constitucinal obrigatória. No Brasil, ela existe para a saúde, para a educação, para tudo. Toda corporação, quando pode, cria uma, suas conseqüências são desastrosas."

Opa, epa!

Qual é o lado do cérebro de Delfim Netto que está pensando? Aquele que recém falou em, via intervenção estatal, diminuir a desigualdade em educação e saúde, ou, o outro, que condena os privilégios aos profissionais de ... educação e saúde??? - contemplando a desigualdade via Estado.

A contradição enorme existente entre as duas afirmações relega ao esquecimento a personalidade pública do erudito, mas político, ex-deputado.

De mais a mais, não há como garantir igualdade de oportunidades, exceto a não legislação de privilégios, que é o que mais existe no Brasil.

Quanto à medicina, o governo paga R$ 7,00 por uma consulta do SUS e os médicos que cobrarem, privadamente, menos do que a tabela serão passíveis de proibição de serem médicos por aviltarem a profissão. Ou seja, o Estado é quem torna a consulta médica mais cara, justamente ao comprá-la em grande quantidade e vil remuneração. Alia-se a isso, aliás, a lei, que dá, a um conselho profissional, o poder de definir remunerações. Privadamente, deve ser digna. Estatistamente pode ser vil.

Qual o lado do cérebro não só de Delfim, mas do brasileiro, está pensando é uma coisa. Outra, que, raramente, os dois pensam a mesma coisa. Ou seja, o povo é, sempre e cada vez mais, político, leia-se hipócrita. Pede igualdade para os outros. Mas, para si, constrói, ou roga, por privilégios frente à lei. Ou seja, reivindica a desigualdade de tratamento.

Delfim Netto, nesta entrevista, tem o mérito de condensar, em algumas contradições, a rationale brasileira. Exigir igualdade, apontar à iniqüidade, rogar por sua extinção e, ato contínuo, provê-la para si.

Assim não tem civilização.

2 Comments:

Blogger negoailso said...

igualdade para os iguais; desigualdade para os iguais; assim é justo.

exemplos: o estatuto da criança e do adolescente, a lei de idosos, a de crimes hediondos, et cetera .

celso antônio bandeira nos alerta que os critérios de escolha são o importante a ser avaliado em questões de isonomia. Então, um soldado pode ser dispensado por possuir 1,55 de altura; mas não pode por ser negro (ou homossexual).

outra coisa é confundir isso tudo com a desejada aceleração econômica...

7:45 PM  
Blogger negoailso said...

correções:

'desigualdade para os desiguais'

'mas não por ser negro'


'aceleração econômica (isso existe?)'

7:50 PM  

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