A sociedade de acesso aberto
Douglass North, 85 anos, no XIX Fórum da Liberdade, em Porto Alegre, noite de 03/04/2006 (Foto Bertrand Kolecza)
ONobel em Economia de 1993, Douglas North, é, além de um excelente palestrante, um grande frasista, espirituoso e, por seus 85 anos, 70 deles estudando economia, segundo declarou a um jornal, permite-se falar abertamente, sem se preocupar em ser um cavalheiro.
Questionado por um participante do XIX Fórum da Liberdade, ontem (03/04/2006), se a fórmula geral do FMI, aplicada a vários países, como o Brasil, é cabível, respondeu "I’ll be talking to those people at IMF in three weeks and I will tell them they are wasting their time doing a lousy job" ("eu vou falar dentro de três semanas com aquelas pessoas do FMI e lhes direi que estão perdendo seu tempo, fazendo um péssimo trabalho").
Ou, ao responder a outra pergunta "o senhor acredita na social-democracia?" respondeu rápido e enfático "No!", obtendo risos da platéia.
Ao lhe questionarem sobre o fato de, no Brasil, o poder Judiciário não garantir o cumprimento dos contratos (N.R.: Uma referência ao fato de juízes darem ganho de causa a peticionantes que, mesmo assinando contratos de financiamento, depois questionam os termos dos juros na Justiça; já há, inclusive, uma indústria dessas ações, tanto que certos advogados recusam tais causas), North disse "If Judiciary do not respect contracts you are in trouble" ("se o Judiciário não respeita os contratos, vocês estão enrascados").
Ao responder a uma pergunta sobre como é possível aos agricultores de outros países acessarem livremente o mercado dos EUA, se o governo lhes concede grandes subsídios, Douglass North foi enfático ao afirmar-se contra qualquer tipo de subsídio e lembrou que os concedidos na Europa são ainda maiores. Lembrou, neste momento, uma frase de Milton Fridman: "there is no such thing as laissez-faire in the world" ("não há uma tal coisa como laissez-faire no mundo"). (N.R.: Fridman é autor da famosa "there is no such a thing as a free lunch" - 'não existe uma tal coisa como almoço grátis', ou, 'não existe almoço grátis').
Aproveitou a lembrança, para dizer que "if it is bad with the government, it is worst without it. So we have to tame it to work for us" (se é ruim com o governo, é pior sem ele. Então temos de domesticá-lo para que trabalhe para nós). A frase, informou, ele a emprega em debates com os "libertarians", (N.R.: que pregam um anarco-capitalismo).
North revelou à platéia de quase três mil pessoas que ele já foi um marxista, "amante do Estado"; depois, um economista clássico (N.R.: defensor do laissez-faire), "odiando o Estado", acrescentando, com um pedido precendente de desculpas, que ambas são "stupid positions" (posições burras), pois, para ele, naquilo que os agentes econômicos (as pessoas, as empresas) fazem bem, o Estado não deve se intrometer; mas existem coisas que a iniciativa privada não fará, logo, aí, deve agir o Estado. Ele se refere, em especial, aos segmentos mais pobres da população, como no Brasil, de enorme desigualdade de renda (N.R.: que ele não atribuiu ao governo brasileiro, concentrador de renda, que empobrece a população, governo que possui remuneração e planos de pensão e aposentadoria fora da realidade econômica do país.).
North, e aqui o mais importante, que ficou para o final, defende uma "open access society" (sociedade de acesso aberto). Para isso, novos atores, com novas tecnologias, não podem, nem devem ser impedidos pelo governo, que, ao o fazer, estará, inevitavelmente, protegendo os atuais atores, detentores de tecnologias e serviços. Ele citou o economista Schumpeter, no que diz respeito a este ponto (N.R.: que enxerga uma destruição criativa, ao existir uma sociedade de acesso aberto, livre, para haver competição e concorrência, que não é só de uma mesma tecnologia, mas, também, de novas tecnologias; vide o caso de uma ferrovia, cruzando, com uma ponte, um rio, onde, até então, o serviço de balsa dominava - é o exemplo de "Quem é John Galt?" ao ser lembrada a história do fundador da ferrovia Taggart).
A tese que North defende, sobre a organização de uma sociedade, postula que é preciso reduzir os custos de transações no mercado. Para isso ser possível, os grupos de interesse econômico não podem apoiar os grupos de interesse político, que, depois, protegerão os grupos econômicos da competição, através de leis e regulações, que dificultarão o ingresso de novos atores, ou seja, fechando a sociedade e não na abrindo, o que, ao fim do dia, resulta em menos e não mais prosperidade (redução da escassez).
"It happens in all of the world" ("acontece no mundo todo"), lembrou o provecto palestrante, que não aparentava sua longa idade.
Mas não há fórmula para eliminar a nefasta relação dos grupos econômicos com os grupos políticos. North afirma sua crença na democracia e oferece, como caminho, "aumentar a competição" no campo político, para que a sociedade imponha, via legal, seu caminho no rumo de uma sociedade de acesso aberto.